Estudo da Federal de Sergipe aponta que 60% dos pacientes oncológicos do SUS e 50% da rede privada fazem uso dessa prática
Estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Sergipe (UFS) aponta que pacientes com câncer estão utilizando cada vez mais a fitoterapia e as plantas medicinais como forma de controle da doença. A pesquisa mostra que 60% dos pacientes oncológicos do Sistema Único de Saúde (SUS) e 50% pacientes rede privada usam plantas medicinais e fitoterápicos junto com medicamentos da quimioterapia. Esse resultado preocupa a doutora em Farmacologia Adriana Andrade Carvalho, professora do Departamento de Farmácia da UFS e coordenadora do estudo. Ela acredita que essa associação pode causar sérios riscos para a saúde do paciente.
Com o financiamento de R$ 50.000,00, aprovado pela Fundação de Apoio à Pesquisa e à InovaçãoTecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec/SE), o projeto vem sendo realizado junto a população do município de Lagarto pelo Grupo de Pesquisa do Laboratório de Pesquisa em Oncologia Clínica e Experimental (Lapoce), que também é coordenado pela professora da Adriana Carvalho. Segundo ela, a partir dessa pesquisa foi constatado que o câncer foi a segunda doença crônica mais prevalente na região e que cerca de 40% dos pacientes oncológicos residentes no município utilizam plantas medicinais durante o tratamento do câncer. “Esse dado alarmante, visto que as plantas medicinais podem interagir com os medicamentos, nos levou a expandir a nossa pesquisa focando só em pacientes oncológicos, que é o que estamos realizando aqui em Aracaju”, revela a pesquisadora.
Alerta aos riscos
De acordo com a pesquisadora Adriana Carvalho, a interação das plantas medicinais e dos fitoterápicos com osmedicamentos da quimioterapia pode trazer sérios riscos para o paciente. Ela explica que o paciente oncológico faz uso de vários medicamentos, tanto aqueles utilizadospara tratar o tumor, tantoos medicamentos de suporte, aqueles utilizadospara mediar as reações adversas do paciente. “Com os dados já coletadosaté o momento, já conseguimos observar algumas interações medicamentosas, como a interação causada entre Capim-Limão e a Ciclofosfamida. Essa planta pode tanto aumentar a concentração plasmática do fármaco quanto diminuir, resultando ouna ineficácia do tratamento ou no aumento dos efeitos adversos. Alterações nabiodisponibilidade do quimioterápico épreocupante principalmente por se tratar de drogas com baixo índice terapêutico, isto é, a dose terapêuticaestá próxima a dose letal”, alerta.
Durante a pesquisa foram observados diferentes tipos de câncer. Os mais prevalentes foram o Câncer de mama e Câncer de próstata. Também foram encontrados os seguintes tipos: Câncer de cólon, Câncer de ovário, Linfoma não-Hodgkin, Câncer de pulmão, Mieloma múltiplo, Câncer de tecido conjuntivo, Câncer de reto, Leucemia linfocítica crônica, Leucemia mielóide aguda, Câncer de estômago, Câncer de bexiga e outros tipos menos frequentes.
A pesquisa está sendo realizada na rede pública no Hospital Cirurgia e no Hospital Urgência de Sergipe (Huse). Na rede particular, quatro clínicas em Aracaju participaram do estudo. Ao todo, 650 pacientes oncológicos participaram do mapeamento. Os dados do estudo mostram que as plantas medicinais mais utilizadas pelos pacientes atendidos na rede privada foram a erva cidreira (43,29%), camomila (39,02%) e boldo (29,89%). Já na rede pública (SUS) foram: erva cidreira (56,70%), capim santo (39,17%) e camomila (33%). Já os medicamentos fitoterápicos mais utilizados foram a própolis (3,05%) e avelós (1,83%).
A pesquisadora Adriana Carvalho destaca a importância desse mapeamento. “Para a saúde pública é muito importante porque a Organização Mundial da Saúde (OMS) já reconhece as práticas integrativas e complementares como terapêuticas. Além disso, com a publicação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), as plantas medicinais e fitoterápicas foram institucionalizadas no SUS. Porém devemos ter cautela na orientação do uso, e principalmente, no não-uso de plantas medicinais e fitoterápicos por paciente oncológico”, finaliza.
Próximo passo
A coordenadora do estudo explica que o próximo passo será avaliar possíveis interações entre as plantas medicinais (PM) e os medicamentos fitoterápicos (MF) mais citados com os medicamentos alopáticos utilizados por esses pacientes. “Inicialmente iremos avaliar possíveis interações entre as PM e MF com medicamentos antineoplásicos, para, no futuro, analisar possíveis interações com os medicamentos de suporte. Inicialmente iremos fazer um estudo in vivo, em animais de laboratório, para, posteriormente, realizar análises in vitro. No Lapoce já temos dois mestrandos que irão iniciar esse estudo in vivo agora em 2016”, detalha.
Quanto aos resultados alcançados até agora, Adriana Carvalho explica que todos os dados serão publicados em revista científica. “Porém, como o acesso a esses artigos são restritos a comunidade científica, o Lapoce está organizando material informativo para ser impresso, divulgado e entregue aos pacientes e acompanhantes atendidos nas clínicas os quais realizamos a pesquisa. Também iremos deixar em formato eletrônico para aquelas clínicas que tiverem interesse”, adianta a professora.
Além da publicação dos resultados, o grupo de estudo está propondo uma estratégia sobre os riscos do uso de plantas medicinais e fitoterápicos para ajudar na capacitação dos profissionais da saúde. “Temos muito chão ainda pra percorrer. Porém, nesse estudo, já comprovamos uma realidade: o profissional da saúde precisa se capacitar quanto ao uso de PM e MF por pacientes oncológicos. Nossos pacientes estão fazendo uso dessa prática milenar. É urgente termos profissionais capacitados sobre o assunto para que orientações possam ser passadas ao paciente. Nesse estudo observamos que 50% desses pacientes relatam ao médico oncologista o uso de PM e MF. Porém, apenas 10% receberam orientações. Em adição, quando falamos em orientação humanizada, caímos no ponto importante para esses pacientes. Essa pesquisa também constatou que a grande maioria dos pacientes utilizam a PM e MF para melhorar a qualidade de vida, com o manejo das reações adversas da quimioterapia. Os pacientes veem nas PM e MF como um suporte, uma esperança. Não podemos simplesmente tirar isso de forma brusca e arrogante. Precisamos saber orientar, utilizando embasamento científico, e, no caso de suspender o uso, que seja feita da forma menos traumática possível. Respeitando as crenças do paciente, sua opinião e sua vontade de tentar fazer o melhor que pode”, afirma a pesquisadora.
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