Professor Daniel Thin participa de estudo sobre a realidade dos acampamentos e assentamentos do Movimento dos Sem Terra no Ceará
Conhecer e estudar a realidade dos assentamentos do Movimento dos Sem Terra no Ceará. Este é o objetivo do professor Daniel Thin, da Université Lumière Lyon 2, que desembarca este mês em Fortaleza e será recebido pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS), da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Ele foi contemplado no último edital da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap) com uma bolsa de Pesquisador Visitante (BPV).
De acordo com a professora Kadma Marques, coordenadora do PPGS, o visitante irá reforçar as atividades acadêmicas do programa de pós-graduação, além de viabilizar a realização do projeto de pesquisa intitulado: Os movimentos sociais como espaços e matrizes de socialização: O caso dos acampamentos e assentamentos do MST no Estado do Ceará.
“Tal projeto porta mérito científico e elementos inovadores, pois não se restringe a uma interpretação sociológica da militância no MST que considere apenas a prática dos agentes reconhecidos e legitimados, mas envolve, sobretudo, aqueles militantes ditos comuns. Com larga experiência na área, o professor Thin tem se dedicado à compreensão dos modos de socialização e das confrontações entre lógicas socializadoras diferenciadas neste campo. Ele tem focalizado particularmente as lógicas socializadoras nos meios populares, principalmente nas frações inferiores das classes populares, e seu confronto com as lógicas socializadoras dominantes, inscritas notadamente nas instituições oficiais, em particular a instituição escolar, portadora do modo europeu de socialização educacional dominante”, esclarece Kadma.
A coordenadora conta que o trabalho de pesquisa de campo proposto pelo professor Thin o levará a aprofundar conhecimentos não só da realidade de Fortaleza, a partir da inserção do MST e do MCP (Movimento dos Conselhos Populares) em bairros como o Conjunto Prefeito José Walter; mas também a realizar viagens ao interior do estado. “Ele irá especificamente a Limoeiro do Norte e Quixadá, onde contará com o apoio dos colegas da UECE, respectivamente, dos campi da FAFIDAM (Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos) e FECLESC (Faculdade de Educação, Ciência e Letras do Sertão Central), a fim de retomar o contato travado em maio de 2015 com os acampamentos do MST, na Chapada do Apodi. Creio que este suporte será de fundamental importância, pois os colegas conhecem bem a realidade do interior do estado e certamente farão uma boa mediação teórica e prática na incursão do professor em campo. Por sua vez, no PPG de Sociologia, no campus do Itaperi, em Fortaleza, ele contará com a interlocução de professores que trabalham em diversos âmbitos da pesquisa sociológica – sociologia rural, dos movimentos sociais, da cultura, etc. Assim, antevemos um trabalho extremamente enriqUECEdor para todos os envolvidos”, detalha a professora.
Durante os quatro meses de permanência do professor Thin, será realizada a segunda fase da pesquisa que teve seu primeiro momento de exploração em maio de 2015, tanto no campo empírico da Chapada do Apodi, quanto da bibliografia pertinente aos estudos sociológicos sobre movimentos sociais. A etapa que começa será dedicada à coleta de dados para a recomposição da história do movimento na Chapada do Apodi; da realização de observações e entrevistas acerca da socialização política dos militantes “comuns”; e de sínteses preliminares.
Resultados preliminares
Segundo a coordenadora do PPGS, o objetivo desta pesquisa é, primeiro, contribuir para a reflexão sociológica sobre processos de socialização nas classes populares. “Ela [a pesquisa] pretende adotar um ponto de vista inovador em relação àquele recorrente na literatura sobre o tema, qual seja, o privilégio concedido à perspectiva dos militantes reconhecidos”, afirma Kadma Marques. Ainda de acordo com ela, para o professor Daniel Thin “interessa particularmente apreender processos de socialização a partir dos efeitos duráveis impressos pela participação em movimentos sociais, como aquele do MST”. Neste universo, ele acrescenta que pretende: “Escolher como objeto a socialização dos ‘neófitos’, dos novos participantes e daqueles que são menos dotados em capitais culturais, escolar e simbólico, e em capital militante a fim de analisar a socialização que ‘está se fazendo’, as transformações em andamento, mas também, as resistências e tensões no processo de socialização”.
Após a fase exploratória do estudo, os pesquisadores perceberam o quanto este período de quatro meses de imersão seria necessário para que fossem obtidos os primeiros resultados da análise proposta. Segundo a professora Kadma, o professor Daniel Thin admite que “a hipótese de uma socialização que transforma profundamente e de forma durável os participantes merece ser verificada e aprofundada, sem entretanto esquecer que nenhuma matriz de socialização é totalmente homogênea e que as contradições ou tensões sempre são possíveis, em particular neste caso, entre as disposições, as experiências ou as relações anteriores dos participantes ‘ordinários’ e os princípios socializadores pautados pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e seus dirigentes”.
Cooperação internacional
Diante da vinda do professor francês, Kadma Marques ressalta que o projeto foi concebido no contexto da celebração do convênio de cooperação acadêmica entre Lyon 2 e a UECE, mediante diálogo estabelecido entre o professor Thin e docentes de dois PPGs da UECE – o de Sociologia e o Intercampi em Educação e Ensino, ambos igualmente contemplados com o edital de Estímulo ao Desenvolvimento da Pós-Graduação (FUNCAP/CAPES). “Foi o aporte financeiro obtido com este edital que possibilitou a primeira visita do professor Daniel Thin aos dois PPGs, em maio de 2015, quando teve a oportunidade de contato com representantes do Movimento 21, na Chapada do Apodi”, explica ela.
No caso do PPG de Sociologia, já há um histórico de intercâmbios com a Université Lumière Lyon 2, a qual o professor Thin é vinculado, que conta com dois convênios de cooperação científica: UECE/Lyon 2 – de 2008 a 2013; e outro de 2015 a 2020.
Para a coordenadora do PPGS, essa parceria longeva reforça o princípio da internacionalização dos trabalhos de pesquisa praticado pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia, da Federal do Ceará. “A participação do professor francês nesta pesquisa evidencia: primeiro, um momento de maturidade e equilíbrio nas trocas acadêmicas entre as duas universidades; segundo, o trabalho de internacionalização desenvolvido pelo PPGS, não só com a França, mas também com a Dinamarca, o México e a Argentina; e por fim, o fortalecimento das linhas de pesquisa do PPGS que apresentam interface com este projeto de pesquisa. Por fim, a vinda do professor Thin nos dá oportunidade de aprofundarmos reflexões teórico-metodológicas acerca do tema da pesquisa, possibilitando a circulação internacional do conhecimento gerado acerca da realidade social do Brasil e, especificamente, do estado do Ceará”, informa Kadma Marques.
Além da professora Kadma Marques, fazem parte da equipe de pesquisa pela UECE, os professores-pesquisadores do PPG de Sociologia: Max Maranhão, Lia Pinheiro, Roberto Marques e Gerciane Oliveira; a bolsista do Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD/CAPES), Anne-Sophie Gosselin. Da parte do Mestrado Intercampi em Educação e Ensino (MAIE): os professores-pesquisadores Sandra Gadelha, Ernandi Mendes e Claudiana Nogueira.
Do lado de Lyon 2, ligados à Faculté d’Anthropologie, Sociologie et Science Politique, está o professor Daniel Thin, que trabalha na interface entre Sociologia e Ciência Política; e a professora Sylvia Faure, socióloga que estará realizando atividades acadêmicas no PPGS da UECE por duas semanas, durante o mês de maio.
De acordo com a coordenadora, nas candidaturas apresentadas ao cronograma II de seleção de BPV da Funcap, o PPGS foi o único curso de pós-graduação stricto sensu da UECE a ser contemplado, “evidenciando o importante processo de internacionalização pelo qual passa o Programa, bem como a afirmação da qualidade das pesquisas sociológicas e antropológicas que vem sendo realizadas nos últimos anos”.
Programa de bolsas
O programa de bolsas de Pesquisador Visitante (BPV) da Funcap tem por objetivo fomentar a mobilidade acadêmica, possibilitando a permanência de pesquisadores com comprovada experiência e elevada competência no desenvolvimento da produção científica, tecnológica e de inovação nas instituições de ensino superior (IES) do estado do Ceará.
Os valores concedidos para BPV variam entre R$5.000,00 e R$5.500,00. O tempo máximo de concessão é de 18 meses e o mínimo é de três meses. De acordo com a Funcap, o benefício tem sido concedido tanto a professores estrangeiros como a pesquisadores de outros estados brasileiros. Os bolsistas ativos atualmente são um americano, dois alemães, um mineiro e um paulista, que desenvolvem pesquisas nas áreas de Metereologia, Física, Medicina e Ecologia.
A Instrução Normativa que regulamenta o programa BPV é de 2009 (Instrução Normativa 08/2009 – Pesquisador Visitante).
Deixe um comentário