Covid Longa: sequelas persistentes e desafios no tratamento Geral

quarta-feira, 12 março 2025
Há cinco anos, a OMS declarava a pandemia (Foto: Agência Brasil)

Cinco anos após a declaração da pandemia, milhões ainda enfrentam as sequelas da covid longa.

(Karen Oliveira – Especial para Nossa Ciência)

Há exatos cinco anos, no dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o planeta passava por uma pandemia. Àquela altura, o vírus Sars-Cov-2, que circulava no mundo desde meados de dezembro de 2019, já havia infectado mais de 100 mil e matado mais de 4 mil pessoas globalmente. Após meses de medo e incerteza, a primeira vacina contra a covid-19 foi administrada no Reino Unido em dezembro de 2020, e o mundo começou a dar pequenos passos para voltar à normalidade. Para algumas pessoas, porém, a vida nunca voltou ao que era antes.

A síndrome pós-covid, também chamada de covid longa, é caracterizada pela persistência de sintomas relacionados à covid-19 por, no mínimo, dois meses após a infecção, segundo a OMS. Uma pesquisa publicada na revista britânica Nature em 2024 estima que milhões de pessoas já sofreram da condição.

Pode afetar vários sistemas

A síndrome é tão complexa quanto a própria infecção pelo Sars-Cov-2, podendo se manifestar como sintomas diversos. “A covid é uma doença que afeta vários sistemas na fase aguda”, explica Pedro Augusto Sampaio Rocha Filho, neurologista e professor de Mestrado e Doutorado em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). “Pode afetar, além do sistema respiratório, o sistema cardiovascular, pode afetar o rim, pode afetar o sistema endócrino, por exemplo”, completa o pesquisador.

Pedro Rocha: o vírus pode chegar ao sistema nervoso central e periférico (Foto: Internet)

De acordo com pesquisadores, as causas da covid longa são diversas e, em alguns casos, não totalmente conhecidas. A síndrome é observada tanto em pessoas que tiveram um quadro grave de infecção quanto em aquelas que tiveram sintomas leves na fase aguda. Segundo Katie Moraes de Almondes, professora do Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), as diferentes variantes da covid-19 também têm um impacto nas sequelas desenvolvidas. “Cada variante desencadeia sintomas específicos”, afirma.

Porém, apesar da síndrome pós-covid poder atingir qualquer um, algumas pessoas correm um perigo maior. É o caso dos já conhecidos grupos de risco, como idosos e pessoas com comorbidades como diabetes e hipertensão. Para essas populações, os sintomas da covid longa podem exacerbar problemas já causados por outras condições.

Entre as sequelas cardiorrespiratórias, os principais sintomas são falta de ar, fadiga e dificuldade ao realizar exercícios físicos. Segundo Armele de Fátima Dornelas de Andrade, professora do Programa de Pós Graduação de Biologia Aplicada à Saúde da UFPE, as sequelas são, principalmente, causadas por danos provocados por inflamações pulmonares durante a infecção por covid-19. “Pode ter sequelas, como, por exemplo, fibrose, alterações de ventilação, e alterações também até da vascularização naquela área, o que pode estar levando a alterar a ventilação do pulmão, a chegada do ar no pulmão”, afirma a pesquisadora.

Sequelas neurológicas

De acordo com Rocha, durante a infecção por covid-19, o vírus pode chegar ao sistema nervoso central e periférico por meio do sangue ou dos nervos cranianos. Um desses nervos, por exemplo, é responsável pela olfação, e o seu acometimento leva à perda da capacidade de sentir cheiro, ou anosmia.

A anosmia, igualmente a outros sintomas como dor de cabeça, insônia, fadiga mental e alterações no raciocínio, são algumas das sequelas neurológicas que podem persistir após a infecção por covid-19. As causas são diversas, como inflamação no sistema nervoso central, trombose e insuficiência circulatória que afeta o cérebro por meio da falta de oxigênio.

Rocha, responsável pelo Ambulatório de Cefaleias do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco (HUOC/UPE), explica que a gravidade da infecção tem um peso no desenvolvimento de sequelas. “Pessoas que tiveram doenças mais leves têm uma chance maior de ter anosmia, de ter dor de cabeça. E desses sintomas persistirem depois que a COVID continuar”, afirma. “Já pessoas que tiveram doenças mais graves e tiveram acometimento do sistema nervoso central por falta de oxigênio no cérebro, essas pessoas vão ter mais alteração cognitiva, alteração no raciocínio, alteração motora.”

Porém, a síndrome pós-covid não se limita apenas a sintomas físicos. Almondes destaca as consequências psicológicas da infecção, principalmente em pacientes que passaram pela Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e que foram intubados. A isolação social, a preocupação com a morte e a desregulação do sono contribuem para o desenvolvimento de sequelas. Quanto maior o tempo de internação e intubação, maior o risco do aparecimento desses sintomas.

Sequelas cognitivas

É comum que pacientes com sequelas cognitivas, ao descrever seus sintomas, coloquem tudo sob o guarda-chuva de “esquecimento”. Entretanto, Almondes explica que a realidade é mais complexa. O que pode parecer apenas um lapso de memória pode ser, na verdade, sinal de outros danos cognitivos.

Katie Almondes: O que pode parecer apenas um lapso de memória pode ser, na verdade, sinal de outros danos cognitivos. (Foto: Internet)

Velocidade de processamento, funcionamento executivo e resolução de problemas são algumas das áreas afetadas pela covid longa, além da memória. Outra característica é o brain fog, ou névoa cerebral, caracterizada por confusão, pouca clareza mental, falta de concentração, fadiga e ansiedade. Estresse, transtorno pós-traumático e depressão também são prevalentes.

Assim como observado com sintomas físicos, idosos têm um risco maior de apresentar sequelas cognitivas e psicológicas, já que essa população tem mais probabilidade de internação durante a fase aguda da infecção. Porém, de acordo com Almondes, um número significativo de jovens desenvolvem sintomas, mesmo aqueles que tiveram covid leve ou assintomática. “Estresse, isolamento social, o próprio impacto psicológico da pandemia, da internação […] foram decisivos para contribuir para o desenvolvimento e agravamento dos sintomas da covid longa”, explica.

Tratamento

Segundo as pesquisas existentes atualmente, alguns dos sintomas da covid longa ficarão com os pacientes pelo resto da vida. “Por exemplo, se for uma fibrose pulmonar, ela é irreversível”, declara Andrade. Apesar disso, tratamentos podem proporcionar alívio ou reversão de algumas sequelas.

Armele Andrade: Tratamentos podem proporcionar alívio ou reversão de algumas sequelas. (Foto: Cedida)

No Hospital das Clínicas da UFPE (HC-UFPE), Andrade pesquisa na área da fisioterapia cardiorrespiratória, buscando maneiras de aliviar os sintomas de pacientes com síndrome pós-covid por meio do condicionamento físico e do treinamento de músculos respiratórios. “A gente tem tido bons resultados no sentido de diminuir o cansaço, de melhorar a qualidade de vida, de melhorar a qualidade de sono, melhorar a distribuição de aerossol dentro do pulmão”, explica.

Já para a anosmia, o tratamento consiste em, diariamente, inalar essências com o objetivo de estimular o olfato. A cefaleia é tratada com medicamentos, e a insônia com estratégias denominadas “higiene do sono”. “De noite não usar tela, não usar celular, televisão”, explica Rocha. Dormir no escuro e num horário regular também são benéficos.

Ansiedade e estresse pós-traumático

De acordo com Almondes, o tratamento psicológico da covid longa foca em amenizar sintomas de quadros como ansiedade e estresse pós-traumático, além de realizar intervenções para pacientes em crise. A reabilitação neuropsicológica também auxilia para mitigar prejuízos cognitivos. “O papel da psicologia é fundamental”, declara a pesquisadora.

Em todas as especialidades, há um ponto em que os pesquisadores concordam: a prática de exercícios físicos é essencial para o tratamento. “O que a gente observa é que aqueles pacientes que têm o hábito de uma atividade física se recuperam mais facilmente às condições de antes”, explica Andrade.

Ainda não é certo se é possível reverter completamente as sequelas da covid-19, já que cinco anos não é o suficiente para ter respostas definitivas. Porém, a comunidade científica observa avanços nos quadros de alguns pacientes. “O que a gente vê na maioria dos sintomas é que eles melhoram com o tempo”, afirma Rocha.

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