Sem floresta, não tem chuva Meio Ambiente

segunda-feira, 11 novembro 2024
A descoberta abre novas perspectivas nas complexas interações dos ciclos de retroalimentação que os cientistas chamam de “oceano verde. (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil)

Estudo indica que formação de novas partículas acima do topo das árvores contribui com as chuvas na Amazônia

Pesquisa desvenda uma importante peça do quebra-cabeça que busca explicar a formação de chuvas na Amazônia, uma das regiões mais influentes no clima global. Segundo o estudo, a floresta é capaz de produzir sozinha aerossóis que, induzidos pela própria chuva, desencadeiam um processo de novas formações de nuvens e precipitação, influenciando assim o ciclo de água, o clima e o balanço energético da Terra.

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O trabalho mostra que, com a chuva, há um aumento na concentração de ozônio que oxida moléculas naturalmente liberadas por gases exalados pela floresta, os chamados compostos voláteis orgânicos, especialmente terpenos. A oxidação produz novas partículas muito pequenas logo acima do topo das árvores, em uma espécie de explosão de nanopartículas (menores que 40 nanômetros). Essas partículas, por sua vez, dão origem a núcleos de condensação que levam novamente à formação de nuvens mesmo em condições de ar puro na estação chuvosa.

Gerando seu próprio ciclo de chuvas

A descoberta abre novas perspectivas nas complexas interações químico-atmosféricas, meteorológicas e dos ciclos de retroalimentação que os cientistas chamam de “oceano verde”, isto é, a capacidade da Amazônia de gerar seu próprio ciclo de nuvens e chuva de forma semelhante ao oceano. Até então, acreditava-se que a floresta não conseguia produzir esses aerossóis, e a hipótese era de que eles vinham de altitudes maiores.

Há urgência em ações para a mitigação das mudanças climáticas

Para que haja chuva, além de vapores d’água, são necessárias partículas atmosféricas que atuem como núcleos de condensação, ou seja, superfícies onde o vapor pode se transformar em gotículas. No entanto, a origem desse processo na Amazônia ainda era pouco compreendida, principalmente durante a estação chuvosa.

Agora, uma equipe internacional, com pesquisadores do Brasil, Alemanha e Suécia, analisou um extenso conjunto de vários tipos de dados do Observatório de Torre Alta da Amazônia, ATTO na sigla em inglês, para mostrar esse processo. Estão incluídas informações meteorológicas, de gases, entre outras.

“É uma simbiose que ocorre em todo o processo. A chuva por um lado limpa a atmosfera, reduzindo o número de partículas. Porém, ao mesmo tempo inicia um processo de formação de novas partículas que vão crescer e servir como núcleo de condensação para a próxima chuva”, explica o professor Luiz Augusto Toledo Machado, autor correspondente do artigo, pesquisador do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) e colaborador do Departamento de Química do Instituto Max Planck, na Alemanha.

Mudança de paradigma

No estudo, os pesquisadores descobriram que, após a chuva, as concentrações de partículas são mais altas próximas ao topo das árvores (dossel), indicando que elas são formadas dentro da floresta. Esse processo persiste na estação chuvosa, que normalmente ocorre de dezembro a maio, indicando formação contínua de partículas dentro do dossel e de uma nova população de partículas.

“Nossas descobertas marcam uma mudança de paradigma no entendimento das interações entre partículas de aerossol, nuvens e precipitação na Amazônia. Essas interações são críticas para compreender alterações no balanço radiativo da Terra, especialmente à medida que as mudanças climáticas influenciam a circulação atmosférica, como os eventos de El Niño e La Niña”, diz Ulrich Pöschl, diretor do Departamento de Química do Instituto Max Planck, também coautor do trabalho, em comunicado da instituição.

Segundo os cientistas, esses resultados são essenciais para entender como mudanças nos padrões climáticos amazônicos podem afetar não só o clima global, mas a estabilidade ecológica.

Sem floresta, não tem chuva

O Brasil vive neste ano uma das piores secas da história, atingindo vários Estados. Na Amazônia Legal, cerca de 69% dos municípios foram afetados em algum grau nos primeiros seis meses, superando o mesmo período de 2023. Foram 531 cidades das 772 da região, segundo levantamento do InfoAmazônia com base no Índice Integrado de Seca, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).

Segundo Machado, o desmatamento e a degradação têm impactos importantes no ciclo de chuvas da Amazônia. “Para haver os gases que formam as partículas, é preciso ter a floresta. Sem árvores e sem vapor na atmosfera, não há partículas, reduzindo ainda mais as chuvas.”

A pesquisa tem apoio da Fapesp e está publicada na revista Nature Geoscience, com o título Frequent rainfall-induced new particle formation within the canopy in the Amazon rainforest.

Fonte: Agência Fapesp

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