Sci-Hub: Democratização da ciência ou crime cibernético? Sustentabilidade

sexta-feira, 8 novembro 2024
Plataforma criada em 2011 pela estudante Alexandra Elbakyan, do Cazaquistão.

Plataforma oferece acesso gratuito a textos acadêmicos e suscita debate sobre o futuro do acesso ao conhecimento

(Nildo Dias e Francisco Paiva)

O Sci-Hub é uma plataforma criada em 2011 pela estudante Alexandra Elbakyan, do Cazaquistão, com o objetivo de facilitar o acesso gratuito a artigos científicos e livros acadêmicos. Esse material, em sua maioria, está protegido por “paywalls” e exige assinaturas caras. Ela começou o projeto por conta das dificuldades que enfrentava para acessar materiais científicos essenciais para seus estudos e, rapidamente, a plataforma se expandiu. Tornou-se o maior repositório de artigos acadêmicos do mundo, com mais de 58 milhões de trabalhos disponíveis.

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A proposta do Sci-Hub atraiu usuários de todos os lugares, incluindo países com ampla disponibilidade de pesquisa, como os Estados Unidos. Em média, a plataforma registra cerca de 200 mil acessos diários. Essa popularidade trouxe à tona o debate sobre a necessidade de democratizar o conhecimento e tornar a ciência acessível a todos, mas também gerou diversos conflitos legais.

Conflitos legais e multas milionárias

Apesar do apelo social, o Sci-Hub enfrenta sérios problemas judiciais. Grandes editoras acadêmicas, como Elsevier e American Chemical Society (ACS), acusam a plataforma de violar direitos autorais e exigem indenizações. Em 2017, por exemplo, uma corte dos Estados Unidos condenou o Sci-Hub a pagar 4,8 milhões de dólares em uma ação movida pela ACS. Essas empresas argumentam que o Sci-Hub não só disponibiliza conteúdo protegido sem autorização, como também impacta seus lucros. Elas garantem que são usados para manter as operações e garantir a qualidade dos periódicos.

Acesso aberto a publicações científicas

Além de ações judiciais, as editoras pressionam para que mecanismos de busca, como o Google, bloqueiem links do Sci-Hub, dificultando o acesso à plataforma. Contudo, esses esforços têm sido limitados, pois o site continua funcionando através de servidores fora dos Estados Unidos e frequentemente muda de domínio para escapar de bloqueios.

Impacto e repercussões

O Sci-Hub influenciou o meio acadêmico ao levantar questões sobre o acesso ao conhecimento. Alguns estudos indicam que artigos disponíveis na plataforma são mais citados que os obtidos por vias pagas, mostrando que a livre circulação de informação científica pode aumentar o impacto da pesquisa. Essa realidade traz o questionamento sobre como o modelo atual de publicação científica afeta a acessibilidade e a colaboração na ciência.

Em países onde as universidades enfrentam dificuldades financeiras, como o Brasil, o Sci-Hub aparece como uma alternativa valiosa. No Brasil, cerca de 75% da produção científica é gratuita e acessível pelo SciELO, mas artigos internacionais ainda exigem pagamentos, o que limita o acesso de muitos pesquisadores locais.

Onde está o conhecimento?

Em 2012, a Universidade de Harvard, uma das mais ricas do mundo, anunciou que não conseguia mais arcar com os custos crescentes de assinaturas de artigos científicos. O diretor Robert Darnton criticou o modelo de publicação, apontando que pesquisadores produzem e avaliam trabalhos gratuitamente, mas depois precisam pagar preços altos para acessá-los. Desse modo, o conhecimento é acessível apenas aos mais ricos.

Debate ético

Print de uma tela do Sci-Hub.

A atuação do Sci-Hub é vista por muitos como um protesto contra o modelo restritivo das editoras e a favor de uma ciência aberta e acessível. Esse modelo alternativo de acesso ao conhecimento reflete um desejo crescente por maior inclusão e equidade no meio acadêmico, embora a legalidade do Sci-Hub permaneça questionável.

A plataforma trouxe ao centro do debate o direito universal ao conhecimento, conforme descrito no Artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que defende o direito de todos ao acesso ao progresso científico. O Brasil, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), reforça esse direito ao estabelecer que o acesso à educação básica é um direito público subjetivo, garantido a todos os cidadãos.

Futuro da ciência aberta

O Sci-Hub se tornou um símbolo tanto de liberdade quanto de controvérsia na ciência. Ele é comparado ao Napster, que mudou o mercado fonográfico no início dos anos 2000 ao tornar a música acessível de forma gratuita e ilegal. As editoras acadêmicas, por sua vez, começam a explorar alternativas. Um exemplo é o modelo híbrido de acesso, que oferece algumas publicações abertas ao público, mas cobra taxas de publicação dos autores. Essa prática, no entanto, transfere o custo para os pesquisadores, o que ainda limita a inclusão, especialmente em países em desenvolvimento.

O fato é que o Sci-Hub desafia as estruturas tradicionais do mercado editorial científico e levanta questionamentos sobre o futuro do acesso ao conhecimento. Ele permanece um recurso controverso, mas essencial para muitos. Isso ilustra a necessidade de novas abordagens que tornem o conhecimento mais acessível e compatível com as demandas de uma sociedade mais justa.

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Nildo da Silva Dias é professor titular da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa) e Francisco Cleiton da Silva Paiva é advogado, servidor público e aluno no Programa de Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFERSA).

Nildo da Silva Dias e Francisco Cleiton da Silva Paiva

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