Plataforma oferece acesso gratuito a textos acadêmicos e suscita debate sobre o futuro do acesso ao conhecimento
(Nildo Dias e Francisco Paiva)
O Sci-Hub é uma plataforma criada em 2011 pela estudante Alexandra Elbakyan, do Cazaquistão, com o objetivo de facilitar o acesso gratuito a artigos científicos e livros acadêmicos. Esse material, em sua maioria, está protegido por “paywalls” e exige assinaturas caras. Ela começou o projeto por conta das dificuldades que enfrentava para acessar materiais científicos essenciais para seus estudos e, rapidamente, a plataforma se expandiu. Tornou-se o maior repositório de artigos acadêmicos do mundo, com mais de 58 milhões de trabalhos disponíveis.
Para continuar entregando conteúdo de qualidade, Nossa Ciência precisa do apoio de seus leitores. Faça um pix para contato@nossaciencia.com
A proposta do Sci-Hub atraiu usuários de todos os lugares, incluindo países com ampla disponibilidade de pesquisa, como os Estados Unidos. Em média, a plataforma registra cerca de 200 mil acessos diários. Essa popularidade trouxe à tona o debate sobre a necessidade de democratizar o conhecimento e tornar a ciência acessível a todos, mas também gerou diversos conflitos legais.
Apesar do apelo social, o Sci-Hub enfrenta sérios problemas judiciais. Grandes editoras acadêmicas, como Elsevier e American Chemical Society (ACS), acusam a plataforma de violar direitos autorais e exigem indenizações. Em 2017, por exemplo, uma corte dos Estados Unidos condenou o Sci-Hub a pagar 4,8 milhões de dólares em uma ação movida pela ACS. Essas empresas argumentam que o Sci-Hub não só disponibiliza conteúdo protegido sem autorização, como também impacta seus lucros. Elas garantem que são usados para manter as operações e garantir a qualidade dos periódicos.
Acesso aberto a publicações científicas
Além de ações judiciais, as editoras pressionam para que mecanismos de busca, como o Google, bloqueiem links do Sci-Hub, dificultando o acesso à plataforma. Contudo, esses esforços têm sido limitados, pois o site continua funcionando através de servidores fora dos Estados Unidos e frequentemente muda de domínio para escapar de bloqueios.
O Sci-Hub influenciou o meio acadêmico ao levantar questões sobre o acesso ao conhecimento. Alguns estudos indicam que artigos disponíveis na plataforma são mais citados que os obtidos por vias pagas, mostrando que a livre circulação de informação científica pode aumentar o impacto da pesquisa. Essa realidade traz o questionamento sobre como o modelo atual de publicação científica afeta a acessibilidade e a colaboração na ciência.
Em países onde as universidades enfrentam dificuldades financeiras, como o Brasil, o Sci-Hub aparece como uma alternativa valiosa. No Brasil, cerca de 75% da produção científica é gratuita e acessível pelo SciELO, mas artigos internacionais ainda exigem pagamentos, o que limita o acesso de muitos pesquisadores locais.
Em 2012, a Universidade de Harvard, uma das mais ricas do mundo, anunciou que não conseguia mais arcar com os custos crescentes de assinaturas de artigos científicos. O diretor Robert Darnton criticou o modelo de publicação, apontando que pesquisadores produzem e avaliam trabalhos gratuitamente, mas depois precisam pagar preços altos para acessá-los. Desse modo, o conhecimento é acessível apenas aos mais ricos.
A atuação do Sci-Hub é vista por muitos como um protesto contra o modelo restritivo das editoras e a favor de uma ciência aberta e acessível. Esse modelo alternativo de acesso ao conhecimento reflete um desejo crescente por maior inclusão e equidade no meio acadêmico, embora a legalidade do Sci-Hub permaneça questionável.
A plataforma trouxe ao centro do debate o direito universal ao conhecimento, conforme descrito no Artigo 27 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que defende o direito de todos ao acesso ao progresso científico. O Brasil, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), reforça esse direito ao estabelecer que o acesso à educação básica é um direito público subjetivo, garantido a todos os cidadãos.
O Sci-Hub se tornou um símbolo tanto de liberdade quanto de controvérsia na ciência. Ele é comparado ao Napster, que mudou o mercado fonográfico no início dos anos 2000 ao tornar a música acessível de forma gratuita e ilegal. As editoras acadêmicas, por sua vez, começam a explorar alternativas. Um exemplo é o modelo híbrido de acesso, que oferece algumas publicações abertas ao público, mas cobra taxas de publicação dos autores. Essa prática, no entanto, transfere o custo para os pesquisadores, o que ainda limita a inclusão, especialmente em países em desenvolvimento.
O fato é que o Sci-Hub desafia as estruturas tradicionais do mercado editorial científico e levanta questionamentos sobre o futuro do acesso ao conhecimento. Ele permanece um recurso controverso, mas essencial para muitos. Isso ilustra a necessidade de novas abordagens que tornem o conhecimento mais acessível e compatível com as demandas de uma sociedade mais justa.
Leia também: Agricultura familiar contribui para a segurança alimentar e o desenvolvimento sustentável
Nildo da Silva Dias é professor titular da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa) e Francisco Cleiton da Silva Paiva é advogado, servidor público e aluno no Programa de Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA/UFERSA).
Nildo da Silva Dias e Francisco Cleiton da Silva Paiva
Deixe um comentário