Em 2021, mais de 15 mil casos de leishmaniose foram notificados no Brasil
Pesquisadores identificaram pela primeira vez no Brasil uma cepa do parasita Leishmania amazonensis resistente à anfotericina B. O fato evidencia a necessidade urgente de novos tratamentos para combater a leishmaniose cutânea difusa, uma doença de difícil tratamento e um grave problema de saúde pública no país.
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Ao analisar amostras de um paciente de 46 anos residente no Maranhão, pesquisadores identificaram pela primeira vez no país uma cepa circulante do parasita Leishmania amazonensis resistente à anfotericina B, um dos fármacos utilizados no tratamento da leishmaniose cutânea.
A doença é caracterizada por lesões na pele que persistem por meses, mas podem se curar. No caso em questão, porém, o indivíduo apresentava a forma difusa de leishmaniose cutânea, considerada rara, de difícil tratamento e associada a uma resposta imune inadequada do organismo.
Além disso, o paciente apresentava coinfecção pelo vírus HIV (causador da Aids), o que tornou o quadro ainda mais difícil de ser combatido. Ele já havia sido submetido a tratamentos prévios sem sucesso, mostrando-se refratário ao esquema terapêutico com dois medicamentos comumente utilizados contra a leishmaniose no país: o antimoniato de meglumina, que foi a primeira escolha para o tratamento da doença por várias décadas apesar de sua baixa taxa de eficácia, e a anfotericina B, que compõe uma das poucas opções no país para tratar a leishmaniose cutânea difusa.
Por esse motivo, pesquisadores decidiram fazer ensaios in vitro e in vivo com a cepa isolada do paciente para testar sua sensibilidade à anfotericina B. “No modelo in vivo, utilizamos camundongos infectados com o parasita isolado e tratados com a anfotericina B, além de submetidos a outros dois medicamentos aos quais o paciente não tinha sido exposto, a miltefosina e a paromomicina”, conta Adriano Cappellazzo Coelho, professor assistente do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp) e coordenador do estudo.
Os cientistas compararam os resultados obtidos nos ensaios in vitro e in vivo com testes feitos com outra cepa da mesma espécie sabidamente sensível a esses medicamentos. Assim, concluíram que a cepa proveniente do paciente analisado apresentou resistência à anfotericina B nos dois casos. Já na análise com os fármacos com os quais o paciente não foi previamente tratado (miltefosina e paromomicina), os animais responderam ao tratamento de maneira similar aos infectados com a cepa sensível a esses fármacos, mostrando que a diferença estava especificamente na resposta à anfotericina B.
“Dessa forma, nosso trabalho demonstrou pela primeira vez a presença de uma cepa circulante no país que é resistente à anfotericina B e, como ela é uma das poucas opções contra a leishmaniose cutânea difusa, isso indica a necessidade urgente de buscarmos fármacos alternativos para combater essa parasitose, já que a falha no tratamento da leishmaniose consiste em um sério problema de saúde pública no Brasil”, afirma Coelho.
Na América Latina mais de 1 milhão de casos de leishmaniose cutânea foram notificados de 2001 a 2021, dos quais 37% ocorreram no Brasil. Apesar de o número de casos no Brasil ter diminuído 14,3% de 2017 a 2021, mais de 15 mil foram notificados em 2021, ocorrendo em quase todos os Estados brasileiros, em especial na região amazônica. Os principais fatores de risco associados à doença são sexo masculino, má qualidade das moradias e moradia próxima a áreas florestais, onde os flebotomíneos, vetor responsável pela transmissão da leishmaniose, estão predominantemente associados.
O artigo Amphotericin B resistance in Leishmania amazonensis: In vitro and in vivo characterization of a Brazilian clinical isolate está disponível para leitura.
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Agência FAPESP / Thais Szegö
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