Comunicação científica no apocalipse Ciência Nordestina

terça-feira, 24 maio 2022

A luta desigual que a ciência enfrenta para chegar de forma correta ao povo é ainda mais agravada pela defasagem das ferramentas de comunicação usadas pelos cientistas

O “misticismo quântico” é um bom exemplo do quanto a divulgação científica ainda precisa avançar no meio de nossa sociedade. A difusão de conceitos intencionalmente distorcidos faz com que o simples fato de ligar uma TV nos faça ver famosos falando em “emanar muitos Hertz”. Este processo toma conotações ainda mais dramáticas com o movimento anti-vacina que tanto vem prejudicando o controle de doenças novas e velhas, como o próprio sarampo, que ousa voltar.

A luta desigual que a ciência enfrenta para chegar de forma correta ao povo e em todos os lugares é ainda mais agravada pela defasagem das ferramentas de comunicação usadas pelos cientistas. Eles ainda tentam usar notas longas e artigos em inglês em periódicos internacionais enquanto a população curte vídeos curtos e dancinhas em redes sociais.

A atualização das ferramentas de divulgação com a sociedade depende da integração de cientistas e profissionais da comunicação com a formação de jornalistas científicos hábeis em construir pontes seguras com as quais a comunicação eficiente seja estabelecida com a sociedade.

Atribuir a função de comunicadores aos cientistas pode trazer uma sobrecarga ainda maior a estas pessoas que cuidam de laboratórios, orientam estudantes, buscam recursos para manter a estrutura funcionando, prestam contas, escrevem artigos e dão aulas.

Essa integração é urgente e necessária porque antes mesmo de transmitir as últimas descobertas e o conteúdo dos últimos artigos publicados, os profissionais da comunicação precisam traduzir para a população brasileira um último grito de socorro que vem dos cientistas.

As pessoas ainda não perceberam, mas o corte de mais de 70% dos recursos sofrido nos últimos anos pode inviabilizar a produção de conhecimento em um país com potencial para liderar o planeta em produção de soluções. A fuga de cérebros dos jovens em formação já é uma realidade e não há condição de manter a estrutura com financiamento nestes patamares.

O processo que vivemos está convertendo todos os cidadãos brasileiros em consumidores de tecnologia externa. Sem ciência estaremos irremediavelmente trabalhando e entregando nossas riquezas em troca de espelhos, como fizeram nossos ancestrais.

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Leia o texto anterior: “Levar” ciência versus “fazer” ciência

Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).

Helinando Oliveira

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