O interesse da empresa e a manutenção de empregos devem sempre ser o norte
Antes de mergulharmos no tema, precisamos falar sobre os tipos de empresa. Esqueça o porte (micro, pequeno, médio, grande) e analise os níveis tecnológicos em que se encontram. Observe então para onde “a mão” de Adam Smith as está empurrando. Desse ilustre economista do século XVIII, colho lá da Wikipedia seu ponto de vista:
“Não é da benevolência do padeiro, do açougueiro ou do cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim do empenho deles em promover seu auto-interesse”.
Acreditava que a iniciativa privada deveria agir livremente, com pouca ou nenhuma intervenção governamental, sendo defensor do free banking (sistema bancário livre). A competição livre entre os diversos fornecedores levaria não só à queda do preço das mercadorias, mas também a constantes inovações tecnológicas, no afã de baratear o custo de produção e vencer os competidores. Ele analisou a divisão do trabalho como um fator evolucionário poderoso a propulsionar a economia. Uma frase de Adam Smith se tornou famosa:
“Assim, o mercador ou comerciante, movido apenas pelo seu próprio interesse (self-interest), é levado por uma ‘mão invisível’ a promover algo que nunca fez parte do interesse dele: o bem-estar da sociedade”.
Como resultado da atuação dessa “mão invisível”, o preço das mercadorias deveria descer e os salários deveriam subir. (Wikipedia)
Concordo em gênero, número e grau com o texto acima. Não existe pão, carne nem cerveja grátis. Olhando uma empresa como um organismo vivo, em um ecossistema nada benevolente, ela precisa evoluir constantemente para que consiga manter vivo seu principal interesse: os empregos que a constitui. Porém, se a evolução não for possível – ou evidente -, pode-se tentar, minimamente, a sobrevivência, inspirando-se em um dos caminhos que nossa evolução mostrou, além da caça: a coleta de recursos existentes.
A realidade
Apesar de as palavras parecerem duras, essa é a realidade. 245 anos depois de publicada, A Riqueza das Nações – obra que sintetiza o pensamento do economista -, continua atual. Maslow reforça Smith, ao afirmar que todos nós somos movidos por interesses. A necessidade de reconhecimento – inata ao ser humano – é um deles. Isto não nos torna egoístas. Estes, inevitavelmente, acabam por cometer coisas impróprias. As empresas, no entanto, são organismos com interesses. Na linha da sobrevivência, sabemos que a maioria dos empreendedores têm de “matar um leão por dia”, e não possuem tempo ou condições ideias para promover a exaustivamente e decantada Transformação Digital (TD). Como observador, desenharei os tipos de empresa que enxergo e um caminho analógico a trilhar, deixando o enquadramento por conta do empreendedor que nos lê.
Tipos de empresa
Tentei enquadrar as empresas em apenas três: as do tipo M, que desenvolvem atividade de manuseio e/ou manufatura intensivamente. As do tipo C, que operam à base de clicks. E as híbridas, chamadas de MC. Utilizando a metáfora do organismo, por simplicidade, defini as empresas como compostas por cabeça (H, head), dedos (D) e braços (B). Como sempre, fiz uma figurinha pra facilitar a visualização de meus pensamentos.
As “M” utilizam com intensidade os braços para manufaturar ou deslocar insumos, e com menor intensidade os dedos, responsáveis por ações como cálculos simples, registros, despachos etc. assim como conectar o “chão de fábrica” à cabeça, utilizada para controlar a relação demanda/oferta intramuros. Por fornecerem recursos tangíveis ao Mercado, a faixa vermelha (produção de recursos) mostra-se muito maior do que a amarela (utilização de recursos). As “C” fazem uso intensivo de ações estratégicas, baseadas em cálculos complexos. Utilizam mais a cabeça do que as outras partes. Não produzem bens tangíveis. Buscam e fazem uso do que o Mercado possa oferecer. Em um nível mais sofisticado, chegam a intervir nas ações das “M”. Por fim as híbridas, “MC”, que trabalham olhando as tendências apontadas pelas “C” e vendo o estoque existente nas “M”. Podemos enquadrar a indústria na “M”, o varejo na “MC” e as empresas de tecnologia e serviços na “C”.
Não por acaso também, a figura mostra a estabilidade de cada tipo de negócio (vide largura de base) como o retorno para cada uma das indústrias (vide topo). Por esta figura, pode-se dizer que a indústria, baseada em commodities, tem maior estabilidade, menores retornos e apresenta maior custo de produção, ao passo que as empresas de tecnologia possuem maiores retornos e, consequentemente, maior sensibilidade a flutuações tecnológicas. Um único nerd pode derrubá-las em segundos.
A Transformação Analógica (TA)
Como alcançar o nível industrial 4.0 não é tão simples, não pretendo insistir no “inovês” de sempre, falando ou propondo coisas como transformação digital, inteligência artificial, modelos de negócio arrojados, Fintechzação etc., mas sugerir uma linha mais pragmática, bem pé no chão.
Nessa linha, uma proposta pragmática, baseada nos tipos que apresentei acima, é a de sugerir àquelas empresas que não possuem condições de encarar uma TD que o façam via caminho analógico: promovam uma Transformação Analógica (TA). Segue então um algoritmo:
É ou não é mais efetivo do que pensar em coisas como big data, Internet das coisas, inteligência artificial, machine learning, servidores computacionais, robôs, manufatura integrada e adjacentes?
Finalizando…
Já ouvimos muito as frases: “Feito é melhor do que perfeito” ou “O ótimo é inimigo do bom” etc. Deixo aqui então uma receita lite: “Uma TA é melhor do que uma não TD”. O interesse da empresa, a manutenção de empregos, deve sempre ser o Norte.
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Leia a edição anterior: Híbridos
Gláucio Brandão é Pesquisador em Extensão Inovadora do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
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