Problemas crescentes, abordagens incrementais Disruptiva

quarta-feira, 21 julho 2021

Inovar é também uma estratégia de eliminar problemas na raiz antes que cresçam rapidamente

Minha intenção era a de colocar o título “Problemas exponenciais, abordagens logarítmicas”, pois, na matemática, são operações inversas. Porém vocês não leriam, achando se tratar de um artigo matemático, o que contraria meu mantra de “popularizar a Ciência para que se empreenda melhor”. Entretanto, aos poucos e suavemente, mostrarei que além dessa abordagem ser mais uma alternativa à lógica do “dividir para conquistar” – um dos vários modos de inovar, é também uma estratégia de matar problemas na raiz antes que cresçam rapidamente, ou exponencialmente, e ainda utilizar os efeitos colaterais positivos dessas soluções (redução de custo, perda de tempo das etapas sanadas etc.) para financiar a solução de outras broncas. Esse é o efeito logarítmico, que pode ser explicado pelo princípio de Pareto, ou regra 80/20, a qual prevê que 80% dos efeitos surgem de apenas 20% das causas; de outro modo, 80% de fatores negativos desaparecem quando se resolvem 20% do que realmente importa, regra que pode ser aplicada em várias outras áreas onde se perceba relações de causa e efeito. Observar que existe um conjunto de broncas e agir rapidamente para resolvê-las, sem perder recursos e tempo preciosos em levantar toda big Picture até definir qual delas é a maior – pois tudo está interligado, é agir no modus startup. Nesse bate-papo de hoje, pretendo descrever o que para mim é a pior forma de tomada de decisão nos negócios em um mundo VUCA/BANI: a atitude linear.

Princípio de Pareto

Explicando por exemplos, recolho lá da Wikipédia:

  •         80% das ervilhas vinham de 20% das vagens (do jardim do próprio Pareto);
  •         80% do faturamento é resultante de 20% dos clientes;
  •         80% das vendas são provenientes de 20% dos produtos;
  •         80% das reclamações são feitas por 20% dos clientes;
  •         80% das vendas se devem a 20% do time de vendas;
  •         80% dos resultados se devem a 20% dos investimentos.
  •         80% dos resultados e consequências são frutos de 20% dos insumos, esforços e causas.

Já entendeu o princípio, né?

O modo linear de ser… E de morrer!

No mundo linear pré-TI, pré-Startup, pré-IA, o formato linear de resolver “as paradas” ou criar produtos, processos ou serviços (PPS): kick-off (reuniões iniciais), vistorias, análise de Mercado (pontos fortes e fracos etc., o velho SWOT), diagnósticos profundos, portfólio de marketing, de processos, de pessoas e de finança, concorrência, plano de negócio etc., o kit completo sugerido pelas consultorias convencionais, dava resultado.

Mas o mundo engatou a 4ª marcha e a transformação digital, ou TD, vingou, transformando tudo ainda mais em não-linear e imprevisível, gritando para a classe empresarial que o modus startup é o único formato de gerenciamento admitido para as empresas. Aceitar ou não é a diferença entre estar no páreo ou virar estatística (negativa) de SEBRAE.

Nesse formato cinematográfico, ou modo linear, uma grande consultoria à antiga entra(va) na fábrica, dá(va) uma grande geral, cobra(va) uma fortuna de fazer Tio Patinhas corar e depois entrega(va) um calhamaço do tamanho da epopeia de Harry Potter, cheia de magos, querubins e dizeres mágicos, pra diretoria da empresa destrinchar. Como de esperar, uma “Missão impossível!”. “Mas não se desesperem, meus amigos: o nosso combo, além da pipoca e do ‘refri’, conta também com assessoria!”. Vamos então à segunda sessão desse filme, que será uma “Colheita Maldita”: por não terem seus problemas iniciais resolvidos, os efeitos colaterais vão se acumulando de forma exponencial, a ponto de estarem diferentes de quando teve início a consultoria. Duro de assistir.

O modus startup ou incremental

Nesse meio tempo, ao estilo Netflix, um bando de nerds da DGJ (nunca ouvi falar nessa startup), saídos da sessão da tarde, com landpages, laptops, caixas de papelão e dispostos a fazer protótipos, entram em uma empresa concorrente e escolhem, praticamente ao acaso, um dos problemas do caldeirão, prometendo a audiência de lá sair apenas na sessão coruja. Admitindo que fazer nada sairá mais caro do que arriscar, executivos e nerds combinam um investimento nível Donald. Conseguem – depois de errarem rápido e barato, cocriando com o pessoal da fábrica e utilizando o processo lean: construir-medir-aprender, resolver uma pequena bronca. Bingo I: estamos no caminho certo! Vamos pra outra, já sendo financiados com a redução do custo advinda da solução anterior. Bingo II, a missão! Ganham experiência no negócio e confiança da fábrica, e recebem recursos advindos das soluções I e II para investirem na bronca III. Observem que os custos das novas soluções estão sendo subsidiados também pela diferença produzida nas performances das soluções I e II. Vamos então à terceira bronca e promover a “Revolution”.

Finalizando…

Pode-se ver que no modus startup, à medida que os pequenos problemas, mesmo aleatórios, são resolvidos, os custos das novas soluções começam a cair incrementalmente. Arrisco dizer que cada nova solução terá um custo 20% menor do que a solução anterior, implicando ainda em um  correspondente aumento de performance superior a 80%, quando for comparada à eficiência do estado em que se encontrava anteriormente, sem contar outra variável muito cara e esquecida nesse processo: o tempo que se leva para tomada de decisão, que poderia ser totalmente investido de forma proativa em uma solução, ao invés de mapeamentos. No formato linear, os ganhos, se acontecerem, serão menores e os danos gigantescos, pois a concorrência lá fora não estará crescendo devagar, mas exponencialmente. O problema é que nosso cérebro, formatado no século XX, faz a “bronca” exponencial parecer muito mais urgente em se resolver do que partir para uma solução incremental, ou logarítmica, a ponto de acharmos que temos de atacar tudo de uma vez. Lembremos do ditado “onde passa um boi, passa uma boiada”. Ao invés de, convencionalmente, perder tempo em traçar um plano para detectar qual foi o boi “treloso”, é mais prático descobrir onde está e fechar a porteira, evitando ter de recolher todo o rebanho. A galera da DGJ levanta um drone, localiza a danada da porteira rapidinho e ainda manda o treco lá pra fechar a bicha. Se a galera quiser, ainda toca os bois.

A coluna Empreendedorismo Inovador é atualizada às quartas-feiras. Gostou da coluna? Do assunto? Quer sugerir algum tema? Queremos saber sua opinião. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag #EmpreendedorismoInovador.

Leia a edição anterior: Por uma postura empreendedora “também” do Mercado!

Gláucio Brandão é Pesquisador em Extensão Inovadora do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Gláucio Brandão

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