Coordenadora de movimento em defesa da Caatinga, Magda Guilhermino, propõe que desenvolvimento sustentável da agricultura familiar do Semiárido gera autonomia da sociedade rural familiar
O Grupo Multidisciplinar de Estudos em Politicas Públicas para Desenvolvimento Sustentável da Agricultura Familiar, Agroecologia e Recuperação do Bioma Caatinga (Geparn), da Unidade Acadêmica Especializada em Ciências Agrárias (Uaecia), da Escola Agrícola de Jundiaí (EAJ), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) em parceria o Grupo de Pesquisa Caatingueiros – Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável do Semiárido (diretório CNPq – 2016) baseados na agenda 21, nas recomendações da Conferência Regional de Desenvolvimento Sustentável do Bioma Caatinga (Caatinga Rio+20) e em seus conhecimentos científicos e expertises em diversas áreas do conhecimento propõe a construção de uma politica publica (PP) intitulada “Defeso da Caatinga” que prevê subsídios para agricultores familiares, para atuarem na recuperação do bioma caatinga a partir da implantação de técnicas agroecológicas de conservação de solos, como os renques e barramentos assoreadores, enleiramento de material vegetativo, raleamento e rebaixamento de caatinga e o monitoramento dessas estruturas e manejo, conforme as recomendações da Emater e, para a restauração ecológica das áreas de proteção ambiental (APP) e reserva legal (RL), segundo as exigências do Novo Código Florestal, Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012 do governo federal brasileiro. Essas tecnologias agroecológicas são técnicas eficientes e efetivas no combate à desertificação, de baixíssimo custo e podem ser feitas manualmente e de forma coletiva. Os recursos para a implantação e acompanhamento da Política Pública Defeso da Caatinga propõem-se a criação do “Fundo Caatinga”, baseada nos mesmos moldes do Fundo da Amazônia, tem por finalidade captar doações para a implantação da politica pública Defeso da Caatinga. Essas doações poderão ser feitas por todos os usuários de recursos naturais como a sociedade usuária de eletricidade, mineradoras, ceramistas, grandes produtores rurais, entre outros, para a promoção da recuperação do Bioma Caatinga, seu uso racional, conservação dos recursos naturais e preservação, pelos agricultores familiares através da criação de um decreto da Casa Civil da Presidência da República do Brasil autorizar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES destinar o valor das doações recebidas em espécie, apropriadas em conta específica, denominado “Fundo Caatinga”.
A partir da implantação da Política Pública Defeso da Caatinga, para que as unidades familiares possam iniciar os sistemas econômicos agroecológicos de produção vegetal e animal para a composição e/ou complementação da renda familiar, atuar na conservação dos recursos naturais (aqueles recursos que serão utilizados para o dia a dia e para a produção como a água, solo, ar e vegetação) e assegurar a preservação das áreas de APP e RL, segue-se a proposta da segunda politica pública intitulada “ECO-TEC – Tecnologias ecológicas de produção econômica e conservação dos recursos naturais”. Essas tecnologias irão dar condições para alavancar os sistemas produtivos através de técnicas que otimizam o uso dos recursos naturais e da produção dos resíduos, que são inicialmente: Sanitário seco, Re-uso da água servida e seu tratamento, Irrigação, Fontes alternativas de Energias (Solar, Eólica e Mecânica), poços e tubulação para acesso e distribuição da água e Dessalinizador, Viveiros de mudas, Biogás, Computador e internet.
Sanitário seco – O banheiro seco é um sistema ecológico por se aproveitar dos ciclos biológicos naturais não produzindo esgoto evitando a contaminação do solo e do lençol freático além da economia de água. É uma tecnologia de baixo custo e de fácil implantação, que tem sido utilizada em diversos países do mundo, como por exemplo, na Finlândia, Dinamarca, Estados Unidos, Canadá, Suécia, Noruega, Japão, Nova Zelândia, Inglaterra e Austrália. No Brasil, a utilização do sanitário seco em zonas rurais, surgiu a partir de uma experiência prática com famílias agricultoras de Santa Catarina, e em agosto de 2008, com famílias do semiárido pernambucano. Sugere-se a metodologia desenvolvida por Johan Van Lengen, 2005, o BASON, porém adaptada às condições únicas de cada unidade familiar do semiárido nordestino do Brasil.
Reuso de água servida e seu tratamento – O reuso de água é a reutilização da água servida na casa do agricultor familiar (água proveniente do banho, lavagem de roupas e louças; não será reutilizada a água servida do sanitário) baseado e adaptado no sistema “Bioágua Familiar”, desenvolvido pelo Projeto Dom Helder Câmara, vinculado a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e com tratamento da água servida através da utilização de minhocas e/ou plantas. A questão da água no semiárido tem sido limitante para a qualidade de vida dos agricultores familiares inseridos em ambiente semiárido, e normalmente, a agua disponível é proveniente da coleta da água das chuvas em cisternas (politica pública um milhão de cisternas), carros-pipas encaminhados pela defesa civil e de poços artesianos que, muitas vezes, são de água salobra. O sistema de reuso de água vem contribuir para diminuir o desperdício de água utilizada no banho, na cozinha e na lavagem de roupas através da sua reutilização em outras atividades que demandam água de menor qualidade como para a irrigação dos viveiros de mudas, hortaliças, frutíferas, palma e capineiras, entre outros. Este sistema é de baixo custo de implantação, é modular com possibilidade de ampliação e adaptação as condições de cada unidade produtiva, pode ser implantado utilizando-se a mão de obra familiar, e a água de reuso não contamina o solo e não produz mau cheiro.
Irrigação inteligente (capilaridade e gotejamento) – A água acumulada através da captação da água servida e tratada será utilizada em sistemas de irrigação. Os sistemas de irrigação utilizados serão aqueles inteligentes, que levam em consideração o horário, a época e a cultura adequada ao semiárido, sendo a irrigação econômica, que utiliza a quantidade mínima de água adequada para a cultura a ser irrigada. O sistema de irrigação deve ser por capilaridade e/ou gotejamento, podendo usar a gravidade e, quando necessário a utilização de energia do bombeamento da água deverá ser feita por fontes alternativas de energia como mecânica, solar e eólica.
Fontes alternativas de energia – são renováveis, pouco ou não poluentes, como a energia eólica, gerada a partir do vento; a energia solar (fotovoltaica gerada a partir dos raios solares; o biogás obtido dos gases provenientes da decomposição de resíduos orgânicos, entre outras. O uso da energia solar, eólica e mecânica nas unidades familiar de produção são uma opção para diminuir os custos de produção e aproveitar os bens naturais que estão disponíveis ao custo zero como é o caso do sol e do vento.
Poços artesianos e tubulação para acesso e distribuição da água- As unidades agrofamiliares deverão ser munidas de poços artesianos, com perfurações com profundidades que atendam a localização de água em condições de qualidade adequadas seja ao consumo humano, irrigação e dessedentação animal. Os poços deverão possuir toda a tubulação necessária para a condução da água até o ponto de armazenamento e distribuição. A energia necessária para o bombeamento da água dos poços deverá ser proveniente de fontes alternativas de energia como as energias solar, mecânica e eólica, de acordo com cada unidade familiar.
Dessalinizador – As unidades familiares inseridas em bioma Caatinga possuem escassez de água de qualidade e a utilização de dessalinizadores pode ajudar a minimizar esse problema. O uso de dessalinizadores vem contribuir sobremaneira para a composição da quantidade e qualidade de água necessária ao desenvolvimento da unidade familiar para qualidade de vida dos agricultores e para os sistemas de produção vegetal e animal. Entretanto, não é toda água que chega ao dessalinizador que será aproveitada. Esse processo gera rejeitos na forma de água com alto teor de sal e o próprio sal. Esses rejeitos são indesejáveis ao meio ambiente, podendo salinizar os solos e, portanto, para a implantação de cada dessalinizador deverá acompanhar um projeto que será implantado de uso de rejeitos que deverão ser aproveitados em outras atividades como criação de peixes de água salgada, na produção de sal de cozinha ou para alimentação animal, entre outras. O dessalinizador e o projeto de uso de rejeitos deverão ser implantados concomitantemente, caso contrário, não haverá a implantação do dessalinizador.
Viveiros de mudas – As unidades familiares precisam implantar viveiros de mudas de plantas nativas da caatinga para a recuperação de áreas de proteção permanente e de reserva legal para atender o Novo Código Florestal do Governo Federal. Estes viveiros serão construídos de forma simples, de tamanho variável de acordo com a necessidade de cada unidade familiar, e poderão também, servir o cultivo de mudas de plantas frutíferas, medicinais e plantas exóticas desde que adaptadas às condições de semiárido, e que tenham função para alimentação humana e ou animal, como por exemplo, a moringa oleífera, que é muito adaptada ao semiárido, considerada a árvore da vida devido às suas qualidades nutritivas.
Biogás – A implantação de biodigestores como fonte alternativa ou complementar de biogás combustível, em e ao gás liquefeito de petróleo (GLP). O Biogás é produzido através de um equipamento chamada “biodigestor” que transforma o esterco de curral em gás (biogás) inflamável, que pode substituir o gás de cozinha comprado em botijões (Gás Liquefeito de Petróleo ou GLP), à lenha, ao carvão vegetal, diminuindo o impacto ambiental. O sistema biogás aqui sugerido baseia-se no sistema “Biogás Sertanejo”, desenvolvido pelo Projeto Dom Helder Câmara, vinculado a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) que é de baixo custo, com a utilização de materiais disponíveis nos armazéns de construção locais, e de manutenção simples.
Computador e internet – A inclusão digital passa pela utilização básica do uso de computador, ferramenta essencial para a aquisição da autonomia dos agricultores familiares. A educação, a capacitação, o conhecimento mercadológico e as negociações passam, necessariamente, pelo uso da internet, sem ela, o agricultor continuará isolado, a margem da sociedade, a mercê de interesses de atravessadores e oportunistas. A juventude rural requer para sua permanência no campo a compreensão dessas ferramentas e sua utilização.
A proposta de politica pública intitulada “ECO-TEC – Tecnologias ecológicas de produção e conservação dos recursos naturais” deverá ser assegurada a todos os agricultores familiares que foram comtemplados na Política Defeso da Caatinga. Os recursos também deverão ser provenientes do “Fundo Caatinga”.
Os agricultores familiares inseridos nas Política Pública Defeso da Caatinga e Ecotec deverão, automaticamente, participar dos cursos de educação, capacitação e inclusão digital que serão oferecidos por instituições governamentais (Senar, Sebrae, UFRN, IFRN, UERN) e não governamentais (ONGs) para o empoderamento e a autonomia da sociedade rural familiar.
Leia a conclusão deste artigo na próxima sexta (23/12/16)
Magda Maria Guilhermino
Coordenadora do Defeso da Caatinga – Geparn/ UFRN
magdaguilhermino@gmail.com
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