Soberana 02 e Abdala Ciência Nordestina

terça-feira, 20 abril 2021

Cuba se prepara para lançar a primeira vacina latino-americana contra a Covid-19, resultado exitoso de um país que investe em ciência

Imagine viver em uma ilha sob intenso embargo econômico por décadas. Continue este esforço mental e tente entender a resposta de um povo que mesmo assim não desiste de sua soberania nacional e permanece acreditando em sua ciência. O resultado para toda a resiliência de Cuba não poderia ser melhor: eles estão prestes a lançar a primeira vacina latino-americana contra a covid-19. E não será apenas uma: além da Soberana 02 e Abdala, outras três vacinas estão em fase de testes. As vacinas são produzidas pela BioCubaFarma e em média carecem de três doses para garantir proteção contra o vírus.

Com vacinação em massa prevista para o mês de julho de 2021, o laboratório cubano tem capacidade de produção de 100 milhões de doses até dezembro deste ano (vale aqui lembrar que a população cubana está por volta de 11 milhões de pessoas), ou seja, a ciência cubana já transborda sua fronteiras e pode ser fornecedora mundial de soluções contra a covid-19. A experiência exitosa de Cuba com a medicina e as vacinas já data de mais de 30 anos e demonstra a importância de uma nação investir na capacidade de seu povo em resolver os seus próprios problemas.  A partir de parcerias com outras nações como por exemplo com a antiga URSS, que formou muitos cientistas cubanos, o empoderamento científico é a melhor forma de atingir a verdadeira independência de um país. Na era atual, definida como a do neocolonialismo, quando nações inteiras voltam a ser render a antigos e novos colonizadores, Cuba permanece firme, soberana, em sua missão de proteger seu povo.

E isto é refletido na forma com que as pessoas tratam umas às umas. Não há como não reproduzir a icônica fala de Fidel Castro: “Hoje milhões de crianças dormirão na rua, nenhuma delas é cubana.”

E cá estamos nós, em tempos de fome, mortes e sofrimento: diariamente mais de 3000 brasileiros morrem pela covid. Precisamos sair deste poço sem fundo. Temos de começar!

Permitam-me recordar mais uma vez dos ensinamentos de meus mestres em resiliência, dois professores cubanos (Jacques e Clara) que vieram nos ajudar a fazer nanotecnologia em um centro de pesquisa no sertão baiano que só dispunha de água destilada e béqueres. É assim que eles conseguem fazer o impossível: acreditando que a ciência vence todas as barreiras.

Estamos vivendo dias terríveis, de perdas e de medo. Nossas universidades estão sofrendo com o sucateamento… E eles, os cubanos, continuam a ser enormes faróis que nos ensinam a construir sonhos na adversidade. Eu aprendi com eles que se não houver carros para comprar, temos de aprender a construir os nossos próprios carros. Se não tiver equipamentos para fazer medidas, improvisaremos os nossos. Há tempo de reclamar e há tempo de solucionar. Se todos estivermos conscientes de que o barco não pode afundar já saberemos que é na ciência que está a solução dos problemas. Sim, “há que endurecer-se, mas sem jamais perder a ternura”. Viva a resiliência do povo cubano!

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Leia o texto anterior: Academia e mercado

Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).

Helinando Oliveira

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