A corrida pela vacina contra a Covid-19 é provavelmente uma das maiores batalhas que a ciência já enfrentou neste passado recente
A corrida pela vacina contra a Covid-19 é provavelmente uma das maiores batalhas que a ciência já enfrentou neste passado recente. As informações são de que provavelmente ela a vencerá em tempo recorde – para quem não conhece os tempos de produção de uma vacina, falar em final de 2020 é algo espetacular, a ser comemorado.
E nesta batalha vencerão as nações que investirem mais recursos, que tiverem os melhores laboratórios e os pesquisadores mais capacitados. Imaginamos, a princípio, que isso não deveria fazer tanta diferença. Afinal, esta luta seria em prol da humanidade, uma vez que a formula deveria ter licenciamento aberto e livre para que todos produzam suas vacinas. Claro, este seria o mundo ideal, ao som de “Imagine” na voz de John Lennon. A realidade não é bem esta. Vivemos em um mundo que está dividido entre nações que apoiam cientistas e nações que oferecem cobaias – a versão atual do histórico “colonizadores e colonizados”, “descobridores e descobertos”.
E como não poderia deixar de ser, o Brasil de 2020 vive um híbrido destes dois mundos: o movimento de apoio à ciência que teve um impulso no início deste século ainda permite com que se desenvolvam vacinas no país. O governo de São Paulo recentemente anunciou o acordo entre o Instituto Butantan e um laboratório chinês que tem a expectativa de realizar um teste em massa com até 9000 brasileiros (terceira etapa do processo de validação). No final, o mais relevante é a expectativa de que estas vacinas sejam produzidas no próprio Instituto brasileiro.
Por outro lado, nossa vocação de fornecedor de cobaias humanas também vem se acentuando. E em alguns casos, sem perspectiva alguma para o prazo posterior aos testes. Tudo indica que cifras astronômicas elevarão as prioridades para o período de vacinação em massa. O episódio dos respiradores serve como balizador e indica que em tempos de guerra a solidariedade (quando houver) começa e termina dentro de cada nação.
O fato é que o modo com que cada nação trata a pandemia reflete o caminho que a conduzirá à saída deste imenso túnel. Negar a ciência e oferecer cobaias não é suficiente. Invadir hospitais e fotografar leitos é criminoso! Quem imaginaria que o Brasil do século XXI praticaria o obscurantismo científico de maneira tão escrachada. Que pena!
No entanto, a entropia (a velha seta do tempo) não deixa muito espaço para divagação. Temos de torcer para que o exemplo de São Paulo prospere e que deste acordo sejam produzidas as vacinas para o povo brasileiro. Que seja esta a saída deste terrível salão de intolerância em que estamos (desconfortavelmente) sentados.
A coluna Ciência Nordestina é atualizada às terças-feiras. Leia, opine, compartilhe e curta. Estamos no Facebook (nossaciencia), Twitter (nossaciencia), Instagram (nossaciencia) e temos email (redacao@nossaciencia.com.br). Use a hashtag CiênciaNordestina.
Leia o texto anterior: Covid e o neoliberalismo
Helinando Oliveira é Professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) desde 2004 e coordenador do Laboratório de Espectroscopia de Impedância e Materiais Orgânicos (LEIMO).
Helinando Oliveira
Deixe um comentário