Um novo organismo Disruptiva

quarta-feira, 15 abril 2020

Saíremos dessa pandemia como um novo organismo, com tudo e todos conectados

Bem-vindos ao século XXI! Parece ser onda minha, mas convenhamos: nosso cérebro registra melhor fatos emocionais do que datas pré-estabelecidas. Duvida? Lembre aí algo marcante de 2001, ano inicial deste milênio! Ok, alguém pode até falar “bug do milênio”, mas isso aconteceu no milênio passado, 2000. Entretanto, agora temos um fato que acelerará nossa entrada no século XXI, no novo milênio: o COVID-19. Sim, senhoras e senhores. Se estávamos naquela de empregos ainda convencionais com um pouco de TI, não muito diferente do que acontecia em 1901, mas com aquelas expectativas de “a TI vai fazer isso”, “a IA vai lascar aquilo”,  “os empregos vão não sei o que” e futurologias latentes, como no Tetris, aquele jogo que à medida que completamos uma linha horizontal os tetraminós – bloquinhos compostos por quatro quadrados – descem, o COVID-19 vai forçar o completar de uma linha horizontal, empurrando pra baixo tudo de uma só vez, no que diz respeito às formas de interação humana e, como consequência, na saúde das pessoas.

Esse monstro invisível, ainda sem vacina, vai pôr uma pá de cal sobre a forma de como nos relacionamos e sobre nosso conceito claudicante de infovia, consolidando o que tínhamos construído até agora como um freio de arrumação ou um aplainar de terreno para se colocar um novo asfalto. Saíremos dessa pandemia como um novo organismo possuindo um arquétipo de sistema nervoso central: tudo e todos conectados. Como a tecnologia 5G promete conexão até “no meio do mar”, cuja implantação deverá ser ainda mais acelerada dada à guerra entre China e USA, talvez o século XXI tenha seu começo lembrado como “O ano em que nos conectamos”… 2020.

Acho os dizeres de futurólogos muito arrogantes. Como não tenho ascendência com Mãe Dinah, não seguirei a linha do “vai ser assim”. Usarei então o “como eu gostaria que fosse” e, de uma maneira elegante, digo o que penso sem que o leitor possa me cobrar algo no futuro. Portanto, para o “errastes feio, GBB-San”, terei espaço de manobra.

Este artigo é um pouco diferente. Será menos científico e mais emocional, já que ninguém nesse planeta azul tem condições de dizer o que vai acontecer no próximo segundo, imagina no pós-pandemia. Descreverei então o que gostaria que acontecesse ao sistema de saúde global/nacional/regional com todo este aprendizado pelo qual estamos passando, pois está provado que o impacto da falta de planejamento para pandemias custará muito mais caro do que a preparação para a próxima. Consultorias falam em retração de 5 a 10% do PIB mundial com recuperação entre 3 e 5 anos. Estimulo o leitor a fazer o mesmo exercício, nesta ou em outras áreas. Vamos lá então!

Sistema de saúde integrado

Como um novo organismo, precisaremos de um novo sistema de saúde. Tecnologias já temos para isso. 

Tecnologia 01: pré-diagnóstico. As tecnologias em detecção do estado de saúde deverão “explodir”. Os conceitos de medicina preventiva (impedir que aconteça) e preditiva (saber o que vai acontecer) ganharão reforços pelos dados colhidos em tempo real. Nesse ritmo de startup em que o Brasil entrou, vi surgir várias soluções quase que em tempo real. Uma plataforma com oxímetro de pulso, detecção de ritmo cardíaco, medição de temperatura e auscultação da tosse acoplada a um smartphone desenvolvido por uma galera do Instituto Federal de Pernambuco (IFPE), por exemplo, pode indicar com precisão superior a 80% a necessidade de este usuário ir a um centro médico. Se do outro lado há um profissional de saúde, este pré-diagnóstico deve chegar perto dos 100%, já adiantando qual o tipo da doença.

Tecnologia 02: termo-referenciamento. A temperatura é a segunda variável mais medida do mundo. Perde apenas para o tempo. Vi muitas propostas de rastreamento de pessoas para detecção de doentes e suspeitos com o intuito de levantamento de caminhos de contaminação. O celular não é bom em medir temperatura corporal, assim como as pessoas não respondem questionários sobre seu estado de forma voluntária. Imagine então termômetros colados ao corpo enviando dados para o smartphone. Abriríamos a era do “termo-referenciamento”, muito mais eficaz do que o georreferenciamento e ainda com um plus: em tempos como este, podería-se obrigar as pessoas a portarem um colar com visor à mostra indicando suas respectivas temperaturas. Assim, ao vir uma pessoal mostrando 37,4ºC em seu colar, o qual já estaria na cor vermelha, você rapidamente desviaria dela, evitando-se o contato. A campanha “Fique em casa” seria convertida a “Mantenha distância”, e o comércio teria um menor impacto, além de esta pessoa ser orientada a fazer o atendimento mencionado na Tecnologia 01, pois já estará sendo termo-rastreada globalmente.

Tecnologia 03: health check in. As aglomerações humanas não precisarão ser interrompidas. Com o uso da Tecnologia 01, você poderá fazer o health check in para qualquer tipo de evento, restaurante, aula, reunião etc. etc. etc. Tendo sido aprovado(a), é só tomar um banho, por um perfume, aquela roupa transada e se dirigir ao local. Para ter acesso ao Uber, por exemplo, o mesmo procedimento de check in terá de ser seguido. Mas aí, você não fez o health check in e foi pra uma aglomeração. “Bronca zero”: com a velocidade que a tecnologia e a escala permitem, os custos e o tempo de teste para detecção do vírus cairão vertiginosamente. À entrada dos estabelecimentos, assim com um glicosímetro, você poderá ser testado, não esquecendo também que você tem a Tecnologia 03 no pescoço.

Tecnologia 04. Confecção de equipamentos e insumos. Vimos instituições modificarem suas linhas de produção para construírem respiradores, máscaras, álcool em gel, hidroxicloroquina etc., assim como erigirem do dia para noite hospitais de campanha. Com as tecnologias acima descritas, a produção poderá ser precisamente planejada, assim como a adaptação de hotéis, por exemplo, em hospitais, evitando-se o colapso do sistema de saúde. À medida que a necessidade sinalizar, a produção é aumentada.

Tecnologia 05. Sistema de saúde dividido em níveis. Para viabilizarem-se, as  Tecnologia 01, 02, 03 e 04 necessitarão de empresas desenvolvidas para cada fim. Todo cidadão terá os custos bancados pelo sistema público ou privado, dependendo de suas condições financeiras. Um sistema ainda pode ser estratificado em níveis: à medida em que a doença se aproxima do hospital, o custo aumenta. Como toda rede será um único sistema de saúde, um super BI (business intelligence) ancorado em blockchain, será capaz de balancear todo sistema nervoso da saúde e computar seus custos em tempo real, disponibilizando o valor médio do custo por paciente em uma espécie de portal da transparência, mostrando o impacto econômico e a condições de saúde por indivíduo. Todas as doenças preexistentes estarão cadastradas assim com o estado de saúde em tempo real, de forma estatística, poderão ser acessado por qualquer um a qualquer tempo. Os dados personalizados só poderão ser acessados conforme as leis de proteção de dados vigentes.

Hipótese gaia: um grande organismo

Um vírus adoeceu toda a Terra. Então, estamos prestes a validar a hipótese de Gaia,  frequentemente descrita como a Terra sendo um único organismo vivo. Se é assim, é imprescindível a criação deste sistema nervoso, já que possuímos todos os meios informacionais além de o COVID-19 ter nos mostrado que o custo para implementá-lo será muito menor do que a aposta e, claro: outros vírus, e sabe-se lá o que, acontecerão sempre.

Finalizando…

O grande reset foi dado. O mundo já é outro e as pessoas aparentam estar cada dia mais eletronicamente conectadas, lutando contra um inimigo comum e ansiosos por uma cura. Se podemos tirar uma lição desta tragédia é que as mortes deverão valer para que nos unamos além da rede virtual, de modo a mitigar os danos a serem causados pelos próximos vírus, evitando epidemias. Do contrário, terão sido perdas em vão.

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Leia a edição anterior: Covid-19: o outro formulário

Gláucio Brandão é gerente executivo da inPACTA, incubadora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).

Gláucio Brandão

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