Abelhas escolhem flores de melão pelo cheiro Pesquisa

segunda-feira, 17 fevereiro 2020
(Foto: UFC / Divulgação)

Pesquisa da Embrapa e UFC indica como as abelhas distinguem diferentes tipos de meloeiro

Os produtores já haviam observado que as flores do melão são pouco atrativas para as abelhas, comparadas às da vegetação que margeia as plantações. Agora cientistas descobriram que a abelha melífera (Apis mellifera) faz distinção entre flores de diferentes tipos de melão. Mais: preferem não visitar as flores de alguns deles, o que é um problema para os plantios comerciais, já que o meloeiro é altamente dependente da polinização das abelhas para frutificar.

O estudo demonstrou que as abelhas africanizadas utilizadas na polinização do meloeiro (Cucumis melo) não apenas usam o odor das flores para distinguir diferentes tipos dessa cultura, mas apresentam preferência por visitar flores de certos tipos de melão em detrimento de outros. Quanto mais visitas a flor recebe, maiores as chances de ela ser polinizada adequadamente, principalmente em espécies cujos frutos possuem muitas sementes, como é o caso do melão. Por isso, a escolha feita pelas abelhas tem influência direta na produção de melões de diferentes tipos

A resposta para esse comportamento está na variação dos compostos voláteis exalados pelas flores. Cada tipo de melão apresenta um bouquet diferente, incluindo compostos atraentes ou repelentes. A presença do volátil relacionado à repelência é determinante no comportamento das abelhas, mesmo quando há compostos atrativos.

Pesquisadores da Embrapa Agroindústria Tropical (CE) e do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Ceará (UFC) estudaram o comportamento das abelhas nas flores dos cinco principais tipos de meloeiro cultivados no Brasil: Amarelo, Cantaloupe, Charentais, Gália e Pele de Sapo. Os pesquisadores investigaram os compostos orgânicos voláteis (COVs) produzidos pelas flores. Eles observaram correlações positivas entre o número de visitas e a quantidade de D-Limoneno e Benzaldeído e correlações negativas com α-Pinene.  masculinas e hermafroditas.

“O composto volátil mais comum na flor do melão está correlacionado com a não visita”, conta o pesquisador da Embrapa Fernando Aragão, que desenvolve um trabalho com melhoramento genético do melão e há nove anos estuda, em parceria com a UFC, a polinização na cultura.

O pesquisador Guilherme Zocolo, que trabalhou com a identificação dos compostos voláteis no Laboratório Multiusuário de Química de Produtos Naturais da Embrapa, explica que pode parecer estranha a presença de um composto repelente nas flores do melão, mas a substância funciona para proteger as plantas de insetos fitófagos, comedores de flores e folhas. “É uma defesa da planta para afastar insetos-praga”, esclarece.

Observação

(Foto: Leandro Lobo-Embrapa/Divulgação)

Nos plantios comerciais, um tipo só de meloeiro ocupa grandes áreas, por isso, é difícil associar variações no comportamento das abelhas aos diferentes tipos de melão. Para realizar o estudo, foram instaladas quarenta parcelas, sendo oito repetições de cada tipo de meloeiro, em uma mesma área, por dois anos consecutivos.

Os pesquisadores acompanharam todo forrageio das abelhas. Coletaram também dados sobre as características da flor, do néctar, do pólen e sobre os compostos voláteis exalados. Cruzaram todas as informações para observar os fatores que influenciavam na visitação e avaliaram os efeitos na produção e qualidade do fruto.

Um dos aspectos interessantes revelados pelo estudo é que as abelhas não visitaram prioritariamente as flores que produziram mais COVs atrativos, mas aquelas que apresentaram quantidades menores de COVs repelentes, particularmente as flores do meloeiro do tipo cantaloupe e de sexo hermafrodita, que foram as mais visitadas. Isso quer dizer que para a polinização as abelhas preferem as flores de meloeiro menos repelentes, não as mais atrativas.

O professor Breno Freitas, coordenador do Grupo de Pesquisa com Abelhas da UFC, conta que durante os estudos, os pesquisadores perceberam que o melão cantaloupe, que foi significativamente mais visitado que os demais, apresentava apenas um composto repelente e em pequena quantidade, o α-Pinene, e vários compostos atrativos. O melão amarelo tem alguns compostos atrativos, mas em uma quantidade menor que o cantaloupe, e apresenta apenas um repelente, mas em uma quantidade bem maior. “O charentais tem um atrativo em pequena quantidade e o resto repelente, alguns em grande quantidade. Isso explica por que a abelha visita menos as flores desse tipo de meloeiro.”

Abelha é responsável por 80% da produção 

“Ficou demonstrado que é necessário fazer um manejo de polinização ajustado para cada tipo de meloeiro”, conclui Freitas. Para o professor, o estudo é importante porque a polinização com Apis mellifera é responsável por 80% da produção de melão. “Os produtores de melão usam colônias de abelhas na área porque, sem elas, não conseguem cobrir nem os custos de produção”, revela.

Além de auxiliar no manejo das abelhas na polinização dos cultivos, o resultado do estudo será útil para programas de melhoramento genético do meloeiro. “Com o melhoramento genético é possível aumentar a concentração dos componentes que atraem a abelha, para que ela visite mais as flores do meloeiro”, afirma Aragão.

A ideia, segundo ele, é começar a identificar os genótipos que apresentem maior concentração dos componentes mais atraentes ou menor concentração dos compostos menos atraentes ou repelentes. “Por meio de biologia molecular, com marcadores, poderemos identificar genes que estão associados à produção dos compostos interessantes e começar a trabalhar no sentido de fixar esses genes nas novas populações”, completa.

Breno Freitas: Generalização em polinização agrícola não corresponde à realidade no campo. (Foto Ribamar Neto UFC/Divulgação)

Freitas salienta que a melhoria da eficiência da polinização é uma forma de aumentar a produtividade agrícola, ou seja, aumentar a produção na área já cultivada sem a necessidade de expandir o cultivo para novas áreas. “É uma das maneiras de atender ao aumento da população e à necessidade de produção de alimento com menor impacto ambiental”, declara.

A pesquisa é oriunda da tese de doutorado de Nayanny Fernandes no Programa de Pós-Graduação em Zootecnia, como parte de uma parceria entre o Grupo de Pesquisa com Abelhas da UFC. Um artigo baseado na investigação foi publicado recentemente, em inglês, no periódico canadense Journal of Agricultural Science. (Artigo disponível em inglês)

Odor

O odor está entre as características florais mais importantes para que as abelhas reconheçam as flores e sejam atraídas por elas. As abelhas sentem os odores por meio de milhares de pequenos órgãos sensoriais localizados nas antenas, fazendo com que seu olfato seja até 100 vezes mais sensível que o humano. Dessa forma, elas são capazes não somente de reconhecer as flores pelo cheiro, mas também de distinguir através de seus odores característicos aquelas que possuem as melhores recompensas de néctar e pólen.

(Fontes: Agência UFC e Embrapa)

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